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Alice Alfazema

Recortes do quotidiano: do meu, do teu, do seu, e dos outros.

Alice Alfazema

Recortes do quotidiano: do meu, do teu, do seu, e dos outros.

Daqui até ao Natal -18

05
Set24

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Claramente o Verão está a terminar, Setembro entra agora como uma flecha no coração do Verão, agonizando as folhas secas e escurecidas caiem das árvores à mais leve brisa, o vento sopra com um som diferente, é o tom da matéria que se consumiu ao sol escaldante dos últimos meses, numa pauta solene caem umas depois das outras, enchendo a estrada de tons dourados e castanhos velhos. Está mais frio,  não quer dizer que venha para ficar em permanência, e que  não apareça mais calor insuportável, mas os dias certamente estarão mais pequenos, e o pôr do sol não terá a mesma preguiça para se ir embora.

É impressão minha ou as andorinhas gritam menos agora, limitam-se a voar, mas não num voo alegre e rápido, circulam apenas em silêncio, foram-se as piruetas e os voos picados rasantes, é uma despedida, como quem prepara a bagagem e confere a ver se nada falta. Talvez nos vejamos para o ano, quem sabe? 

Daqui até ao Natal - 3

21
Ago24

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A arte de fazer o outro feliz é menos exigente do que a arte de ser-se feliz. Há pessoas que têm medo de serem felizes, quantas vezes já ouvimos: é sol de pouca dura; está tudo a correr tão bem que até tenho medo... talvez por a felicidade ser de curta duração, e depois? Então não se aproveita um momento bom porque a seguir vem um mau? 

Esta descrença profunda pelo quotidiano, a não aceitação das nossas emoções e daquilo que somos capazes de fazer para ultrapassar cada problema é como uma peçonha que cola como a própria sombra em dia de sol. 

Daquilo que eu tenho saudades, é de ouvir risos, conversas alegres...quando venho no comboio raramente se ouvem vozes, muito menos risos, é um silêncio embutido em chumbo, por todo o lado o foco é o telemóvel e os fones nos ouvidos, pescoços curvados como gente muito velha, alheamento total pela paisagem que passa ao longo de cada janela. Vive-se dentro de um ecrã. Ali se partilham todas as emoções, de modo escrito, em fotografia, e por último em áudio (tenho visto muito, coloca-se o telemóvel rente aos lábios e a coisa dá-se), pode parecer uma conversa, mas na realidade não é, é antes um monologo à espera de resposta. 

Da janela o céu passa azul velozmente entre as árvores paradas.

Daqui até ao Natal -2

20
Ago24

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Hoje pela hora do almoço, indo eu a andar e a ver como param as modas, eis que pela minha frente um homem jovem vem empurrando um carrinho de bebé, com uma mão empurra o carro, com a outra consulta o telemóvel, eu olho de lince...vejo que a criança está a escorregar pela cadeira, já tendo parte do corpo fora dela, digo-lhe então que o bebé está a cair, ele não liga, ou não percebe, não sei bem, como o homem não reage chego-me à frente e empurro um pouco a criancinha para cima, aí o homem parece acordar do coma e vê finalmente o que estou a tentar dizer-lhe, então rapidamente puxa mais a criança para cima, mas como não me dou por vencida facilmente, coloco um braço da criança na alça da cadeira e explico, como se não fosse óbvio que aquilo tem de estar a prender braços e pernas, acho que ouvi o homem dizer obrigado, mas o que me fascinou foi o miúdo esticar a mão para mim e dar-me um "passou bem" em jeito de agradecimento. Não teria mais de oito meses, entretanto a minha amiga esperava-me mais à frente para continuarmos a ver as montras.

Nota: se a minha filha estivesse comigo iria dar-me o sermão do costume: (...) as pessoas podem não gostar(...) não deves fazer isso(...)

Ainda olhei para trás para confirmar se o homem estava ou não a prender a criancinha.