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Alice Alfazema

Recortes do quotidiano: do meu, do teu, do seu, e dos outros.

Alice Alfazema

Recortes do quotidiano: do meu, do teu, do seu, e dos outros.

Tempo do desassossego

24
Fev23

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IMG_20230129_081527.jpg Nasci num tempo em que a maioria dos jovens tinham perdido a crença em Deus, pela mesma razão que os seus maiores a tinham tido — sem saber porquê. E então, porque o espírito humano tende naturalmente para criticar porque sente, e não porque pensa, a maioria desses jovens escolheu a Humanidade para sucedâneo de Deus. Pertenço, porém, àquela espécie de homens que estão sempre na margem daquilo a que pertencem, nem veem só a multidão de que são, senão também os grandes espaços que há ao lado. Por isso nem abandonei Deus tão amplamente como eles, nem aceitei nunca a Humanidade. Considerei que Deus, sendo improvável, poderia ser, podendo pois dever ser adorado; mas que a Humanidade, sendo uma mera ideia biológica, e não significando mais que a espécie animal humana, não era mais digna de adoração do que qualquer outra espécie animal. Este culto da Humanidade, com os seus ritos de Liberdade e Igualdade, pareceu-me sempre uma revivescência dos cultos antigos, em que animais eram como deuses, ou os deuses tinham cabeças de animais.

Bernardo Soares, In Livro do Desassossego 

 

 

Fenix

06
Nov21

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Ilustração Cathy Veali

O tempo pára,
o tempo é a água azul do rio
que se estende à minha frente
na despedida do estio;
O tempo pára,
o tempo é a água azul do rio
e eu sou barco, sou gaivota,
sou onda leve e lenta
que cobre a areia sedenta;
O tempo pára,
o tempo é a água azul do rio,
amante doce e tranquilo
em que diluo minha vida,
que vai e me leva a mágoa,
que me liberta na volta
qual fénix renascida.
 
 
 
Poema de Vanda Sôlho

A vida passa lá fora

09
Mai21

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A vida passa lá fora, como se nada fosse, e sinto que o meu tempo foi-me roubado nestes últimos meses, o que não fiz e queria muito fazer, se a minha vida acabasse agora estaria incompleta, provavelmente ficará sempre incompleta, mas quero que seja o mais preenchida na medida do possível. Quando somos jovens pensamos que temos todo o tempo do mundo, depois o tempo transforma-se num túnel, cada dia mais afunilado, e aí cada dia passa a valer muito mais que as vinte e quatro horas estipuladas. Deixamos de considerar como úteis tarefas que antes eram imprescindíveis, e sinto que talvez venha a valorizar as horas vazias e os dias de coisa nenhuma, pois neles completo aquilo que me falta, que é ter tempo para mim, como num final de uma maratona, que ao esforço importa apenas depois descansar. 
 
 
A vida passa lá fora,
Ou na pressa de uma roda,
Ou na altura de uma asa,
Ou na paz de uma cantiga;
E vem guardar-se num verso
Que eu talvez amanhã diga.
 
 
Poema de Miguel Torga