Ilustração Martín La Spina
E é uma sociedade mais feliz?
Não. Mas criou-se este espírito de egoísmo… Antes, se passávamos por alguém que parecia estar em apuros, parávamos para ajudar. Hoje, se passamos por alguém que parece atrapalhado, aceleramos, não nos vá chatear.
O que é que nos faz evoluir?
A cooperação. Evoluímos quando andamos em congressos, quando ouvimos colegas, quando pensamos com os outros. Debatemos, argumentamos e saímos de lá, uns e outros, mais esclarecidos. Dialogamos.
Hoje ainda se assiste muito ao exercício do poder mesquinho? O superior que tenta impor a sua vontade, o funcionário que tem o poder de bloquear ou fazer andar um processo, um professor que pode passar ou chumbar… Ter o outro na mão e fazer gala nisso?
Sabe, uma vez dei um 20 a uma aluna, foi um escândalo. Um professor veio logo perguntar: “Então deu 20 valores a uma aluna?!” Dei. Era um trabalho individual, entendi que eu não teria feito melhor, que nota havia de lhe dar? Nota máxima. Responde ele: “Eu não dou mais de 15 valores. Acima disso é nota para professor.” E pronto, ficámos assim. É a necessidade de criar uma distância... Lembro-me de outra vez, uma aluna mais velha do que o habitual, dos seus 40 e tal anos, que estava a estudar Psicologia, ter vindo falar comigo e dizer que estava muito zangada com um professor lá da faculdade porque em conversa lhe disse: “Ó, professor...” e ele respondeu: “Professor?! Senhor professor, trate-me com respeito.” Eu conhecia esse professor, que era até um homem simples, e não acreditei assim muito na história. Passado um tempo encontrámo-nos, fomos tomar café e ele contou-me a mesma história: “Calcula tu que uma aluna…” Afinal era mesmo verdade. Quando na realidade o tratamento por professor foi até simpático e também uma prova de afecto. Este é um aspecto importante das sociedades neoliberais, a concorrência, a competição. E - por isso - da distância.
Entrevista de Isabel Tavares a António Coimbra de Matos, muito interessante, ler mais aqui.
Alice Alfazema