Ilustração Lisa Aisato
Alice Alfazema
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Ilustração Lisa Aisato
Alice Alfazema
Tenho o resto do cozido que ficou do jantar de ontem ao lume, estou a acrescentar mais repolho, não tarda nada está toda a gente aí para almoçar, devem de vir esfaimados. Lá fora está um frio de rachar qualquer pele que se esgueire à portada. Já estendi roupa e já a recolhi, passei mais um monte dela, aspirei e dei um jeito pela casa. Em resumo vou dizer que não fiz nada. Que é aquilo que as mulheres dizem à segunda feira quando voltam ao emprego.
Também já coloquei aqui umas duas conversas da escola, e agora deparei-me com este texto do blogue Âncoras e Nefelibatas:
Passo de moto, ou de carro, aceno. Parte das vezes não me reconhece. Cabreiro, magro e velho, tisnado do sol, roupa suja e surrada, o saco do farnel à cinta, a mulher demente já. Encostado ao pau, os cães de roda.
Hoje, ali ao fundo da ladeira do «um pouco mais de azul» estaciono o carro, saio e tiro os óculos de sol: é ti manel, às vezes digo-lhe adeus quando passo mas você nem dá conta de quem é…
Conhece-me finalmente, trata-me pelo nome do meu pai. Dá-me os sentimentos pela minha irmã. Abraça-me sem pejo ou cuidado, pendurado em mim, um braço por cima do pescoço, a outra mão que deixa o pau atrás. O cheiro intenso a cabras e suor. Os cães roçam-se-me nas pernas ainda molhados do mato. Nim sê o que te diga rapaz! Isto a vida é um ‘nstante. Nã vale a pena a gente andar cá com manias…
A roupa que trago no corpo aqui em casa ainda cheira bem. Do abraço dele e do pêlo dos cães.
E a vida é assim, há textos que nos dão ânimo ao dia.
Logo ao jantar haverá massa do cozido com muita hortelã e talvez um bolo de mel com canela. Apetece-me o cheiro de um bolo cozido com mel e canela e na mão uma chávena de chá bem quente. Está muito frio lá fora e há gente que dorme ao relento, e gente que tem fome e não tem o que comer, e gente tem o que comer e passa fome, e gente parva, e gente inteligente, e gente que tem a mania que é mais que gente.
Alice Alfazema
Era uma vez uma casa, quem morava lá era muito feliz, sorriam muitas vezes durante o dia, tiravam muitas fotografias e estavam sempre atentos às noticias do momento. Todos os que moravam naquela casa tinham opinião sobre todos os assuntos, eram convictos naquilo que diziam, verdadeiros, activos nas mensagens de partilha. Havia o mundo deles e o mundo dos outros. O mundo deles era aquela casa.
Alice Alfazema