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Alice Alfazema

Recortes do quotidiano: do meu, do teu, do seu, e dos outros.

Alice Alfazema

Recortes do quotidiano: do meu, do teu, do seu, e dos outros.

Azoia

canto ou encanto

19
Abr22

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Quantos segundos são necessários para admirar uma flor? Durante quantos dias podemos admirar a primavera? Quanto tempo dura o encanto sentido pela descoberta das cores nascidas da terra? Desta descoberta renascem os sentimentos mais precoces da vida, onde a semente se encontre escondida num campo ainda por desbravar.

Na medida dos passos de cada um, a honestidade de querer criar raízes, mesmo sabendo que o vento sopra de norte e a luz é coisa rara. A água abundante do orvalho supera a das nuvens, dura é a terra, vermelha escura, onde os buracos dos lagartos são de um redondo perfeito.

 

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No cume as flores são pequeninas, desenvolvem-se em pormenores e em cores cativantes, é aperfeiçoar o olhar, nunca o toque, é no olhar e no cheiro abundante dos arbustos que a alma reflecte sobre o que realmente merece ser vivido. É dado um banho no espírito, ficando  o sangue a pulsar como cascata. 

 

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Seguem-se os passos dados com cuidado, suspendem-se os pensamentos para agarrar aquela memória, o cascalho solto por entre os caminhos entala-se debaixo dos pés, dificultando a caminhada, algumas pedras são tão pontiagudas que se atarraxam nas solas dos sapatos, coisas mínimas, coisas mínimas.

 

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No meio disto os pássaros fazem voos rasantes aos bagos que por ali abundam, talvez seja uma festa, parecem vestidos de gala, ao sol as suas cores destoam do fundo azul do céu, o céu está liso, impecavelmente liso, parece que foi passado a ferro com esmero, nem um vinco.

 

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Tive vontade de descansar, e sentei-me, porque descansar é preciso, assim como viver é preciso, e todas as coisas ao meu redor também descansaram, como se fossemos companheiros. O tempo parou, uma abelha deixou de zumbir, uma aranha estagnou na sua teia bordada, apenas as formigas continuaram no seu caminho sem fim.

 

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A beleza daquele lugar é vulgar, criada pelo desassossego do vento, do sol e da chuva, assim como são vulgares as palavras simples, ou o correr das horas. Vulgares caminhantes afastam-se de mim, não existem vozes que descrevam com exactidão a imensidão de um segundo ali vivido.

 

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A Azoia eleva-se acima do gigantesco oceano que agora manso se curva a seus pés, em dias de tormenta ouvem-se os seus uivos dolorosamente esbatidos nas falésias seculares. Está calmo o dia, aparentemente calmo. Com a mesma calma amarelecem os minúsculos prados.

 

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Sabe-se que em breve vão desaparecer, por enquanto erguem-se aos céus, bradando a sua beleza singular aos mais incautos caminhantes, depois recolhem à terra na esperança que haja uma nova primavera.

A pesca do cerco - Património Imaterial

22
Jun13

Como o tempo é de comer sardinhas deixo-vos aqui um pequeno texto que fiz sobre a pesca do cerco, quando comerem o peixe lembrem-se que ele não vem das bancadas do hiper ou de um outro qualquer lugar, mas sim daquele mar lindo que temos e que é pescado por gente que sabe muito de suor e de lágrimas.

 

 

 

A pesca de cerco é uma arte que se enquadra no âmbito de processos e técnicas tradicionais. Estão a ela associados saberes, objetos e lugares. Esta arte manifesta-se ao longo da costa portuguesa, tem no entanto algumas variações entre lugares. Assim, a sul do Tejo as embarcações são de menores dimensões e muito diferenciadas nas suas características. Na região norte podemos encontrar embarcações mais recentes, enquanto no Algarve a frota é bastante envelhecida. Esta atividade é levada sobretudo para a captura da sardinha, pode no entanto capturar outras espécies, tal como a cavala, o carapau e a sarda. No continente, é feita nas águas costeiras da plataforma continental, faz-se ao longo do ano e a sua atividade é regulamentada por legislação nacional. Geralmente as embarcações são pequenas comunidades familiares que mantêm o seu saber no seu núcleo.

 

 

            Dantes as docas encontravam-se repletas dessas embarcações, entretanto com a modernização das técnicas de pesca, a globalização do comércio e as exigências das cotas pesqueiras feitas pela UE, houve uma drástica diminuição nas frotas pesqueiras. Apesar das adversidades encontraram-se caminhos para manter a atividade. Tais como, a criação de projetos certificados, entre eles a conserva artesanal de pescado e a gastronomia como oferta turística. São exemplo os festivais da sardinha, os petiscos, entre outros. As histórias de vida vêm também enriquecer este património.

 

 

             As viagens para a captura do peixe, têm a duração de 12 horas e fazem-se próximo do porto de partida. Esta pesca divide-se em quatro etapas, a “ largada da rede, viragem da retenida, alagem da rede e transbordo do peixe”. O Mestre é o responsável pela embarcação e cabe-lhe decidir e efetuar o lance de pesca. As embarcações mais pequenas são designadas por rapas ou tucas e as de maior dimensão são as cercadoras e as traineiras. As cercadoras utilizam uma pequena embarcação auxiliar a que se dá o nome de chalandra ou chata. A frota só está autorizada a pescar “ ¼ de milha de distância da costa, e apenas em profundidades superiores a 20 metros”.

 

             Aos lances podem acontecer duas coisas: slipping ou transbordo. O slipping corresponde à libertação deliberada da captura, no entanto esta manobra é feita de modo a que o peixe nunca saia da água, o que não acontece noutras artes. Existe também a partilha de captura entre embarcações, exemplo disso são as chamadas “enviadas” existentes em Sesimbra que “ transportam a captura de um lance para o porto de desembarque enquanto a traineira prossegue a pesca”. Sendo a pesca de cerco uma atividade tradicional e de interesse nacional, esta atividade enquadra-se na diversidade cultural e pode garantir o desenvolvimento sustentável. Existe uma correlação entre as comunidades na produção e recriação de modos de vida, que de algum modo contribuíram para a sua salvaguarda e tomada de consciência das gerações futuras.

 

Deixo-vos um video para que possam apreciar esta arte.

 

 

 
Boa sardinhada!
 
 
Alice Alfazema