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Parece que há malta indignada com as algas que estão a dar à praia, ali para os lados das praias da Arrábida, uns não sabem o que é, outros estão perplexos com tamanha afronta da natureza, como é que aquilo veio dar à praia (?), manchando as águas cristalinas semelhantes aos mais belos trópicos, que praia mais linda manchada pelo horror de plantas lembrando uma sopa de caldo-verde. O pânico instalou-se. Como vou molhar meu rico pezinho em tal caldo(?). E o dinheiro gasto no protector anti-areia (?), será que também dá para prevenir a aderência da ervinha na pele delicada (?). Ó Deus porque nos fizestes tão comichosos?
Eu uma pessoa do tempo em que a malta ia para Troia, praia de dias de água cristalina e de muitos outros de algas e alforrecas, em que nos tínhamos de atirar à água sem grandes contemplações, mergulhando e rezando para que a malvada da alforreca que havíamos mapeado não mudasse de direcção rapidamente, mentira isso não acontece, elas andam ao sabor da corrente, e eram grandes e largas, fazendo lembrar gelatinas acabadas de sair das taças, nesses dias os mergulhos eram mais rápidos, mas nunca a praia deixou de ter o seu genuíno encanto.
Agora, neste mundo (que se quer) tão perfeito, é tudo tão, mas tão monótono, que se torna enjoativo, a perfeição da pele, a perfeição da escrita, a perfeição do peso, a perfeição das palavras escolhidas para as entrevistas, a resposta a dar e a resposta a ter, sem surpresas, a par disso há cada vez mais desconhecimento para com a nossa origem natural, um paradoxo, uma vez que se diz (mas não parece) que somos das gerações com mais conhecimento adquirido.
Será que a culpa foi do Óscar?
são ossos
ou músculos
ou cartilagens
- na verdade
eu não entendo nada
de anatomia -
que me parecem umas asas
nas costas
só descobri que as tinha
há algumas semanas
quando me atrevi
a me vasculhar
frente a um espelho
eu tenho medo de espelhos
os evito desde que
por causa deles achei
umas muitas linhas brancas na barriga
e furos enormes nas coxas
mas gostei de descobrir minhas asas
olho como se movimentam
dependendo do que faço com os braços
imagino agora qual forma
devem estar tendo
enquanto escrevo sobre
meu reflexo
por tanto inominável
por tanto tempo nunca chamado
de
meu corpo
Já aqui disse que gosto de dias de tempestade, gosto de apreciar a Natureza na sua suprema vontade, a ideia de que somos apenas marionetas neste universo manifesta-se no pouco que valemos na sua vontade. O facto de não respeitarmos - e de ainda não admitirmos - que vivemos em cima de um sistema muito inteligente e que por ele somos controlados, faz-nos ainda mais vulneráveis aos seus desígnios.
– Menino, vem para dentro,
olha a chuva lá na serra,
olha como vem o vento!
– Ah, como a chuva é bonita
e como o vento é valente!
– Não sejas doido, menino,
esse vento te carrega,
essa chuva te derrete!
– Eu não sou feito de açúcar
para derreter na chuva.
Eu tenho força nas pernas
para lutar contra o vento!
E enquanto o vento soprava
e enquanto a chuva caía,
que nem um pinto molhado,
teimoso como ele só:
– Gosto de chuva com vento,
gosto de vento com chuva!
Poema de Henriqueta Lisboa