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Alice Alfazema

Recortes do quotidiano: do meu, do teu, do seu, e dos outros.

Alice Alfazema

Recortes do quotidiano: do meu, do teu, do seu, e dos outros.

Ainda estamos num Estado Laico? Ou nunca estivemos?

06
Mar23

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Alguém que me explique: estamos ou não num Estado laico? Porque é a Igreja a decidir se afasta ou não - os padres suspeitos de pedofilia? Abusos sexuais contra crianças são ou não são crimes públicos?  Memorial em homenagem às vítimas? 

"Tendo a Igreja, como valores a proteger, o Sexto Mandamento do Decálogo e os bons costumes com reflexo na imagem de si própria, menosprezou por demasiado tempo a pessoa das vítimas-crianças, elas mesmas, por sua própria natureza, incapazes de voz credível aos olhos do mundo. A ocultação do fenómeno correspondia afinal a uma cultura. Errada cultura, mas uma cultura aceite pela comunidade, também ela, em boa parte, cúmplice interessada do silêncio assim instalado. Às pessoas vítimas cabia a guarda do seu próprio segredo, condenadas ao silêncio e a um sofrimento interior, também ele ocultado, ao longo de uma vida. Verifica-se, assim, que «o segredo, conjugado com a responsabilização da criança, por parte do agressor, pelas consequências para ele próprio, para a criança e para a família, [ou instituição], se revelar de alguma forma a situação […]"

"Ora, sendo, embora, vastíssima a lista de funcionários ou equiparados prevista naquele referido artigo 386.º, é legítima a conclusão de que nela não vêm a caber também membros, quaisquer que eles sejam, da Igreja Católica portuguesa, apenas enquanto tal, conclusão a retirar tanto do texto do artigo citado, como ainda, se tanto fosse necessário, da leitura conjugada deste com a da previsão do artigo 5.º da Concordata entre a República Portuguesa e a Santa Sé, onde se prevê que «os eclesiásticos não podem ser perguntados pelos magistrados ou outras autoridades sobre factos e coisas de que tenham tido conhecimento por motivo do seu ministério».

Texto retirado do Relatório final (para ler o relatório clique no link): Dar a Voz ao Silêncio - Comissão Independente para o Estudo dos Abusos Sexuais contra as Crianças na Igreja Católica Portuguesa.

Três cabeças

28
Dez22

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Fotografia Renatas Jakaitis 

Resumindo, Alexandra Reis recebeu meio milhão de euros de indemnização ao ser "despedida" da TAP (empresa intervencionada monetariamente com alguns milhões pelo Estado português, vulgo contribuintes), parece que a  senhora engenheira ajudou a reestruturar a empresa, despedindo largas dezenas de trabalhadores, reduzindo salários, conduzindo os montantes a receber pelos trabalhadores...enfim, despachou-se rápido no seu trabalho e saiu mais cedo, foi pregar para outra freguesia.

Talvez seja escandaloso, mas parece que é prática habitual gestores e administradores (público/privado) de reestruturação de empresas (forma fina e elegante de dizer: despedimentos colectivos de trabalhadores), receberem ordenados chorudos por essa tarefa fundamental, e depois de a concretizarem em tempo recorde recebem ainda indemnização fabulástica, feitas as contas verifica-se que a empresa pouco dividiu pelos trabalhadores ( Trabalhadores: são seres que contribuíram ao longo do tempo - muitas vezes dezenas de anos - com a sua força de trabalho para a manutenção da empresa), deixou-se de ter encargos e chatices, o que se poupou deu e sobrou para o ordenado das criaturas e indemnização incluída.

Sempre tive a sensação que o despedimento era sinónimo de insucesso, mas parece-me que no caso de gestores/administradores/directores, o despedimento é considerado um caso de sucesso. Fico ainda a matutar se no currículo dessas pessoas consta a quantidade de vezes em que são despedidos (?), e se isso é um bom ou mau indicador para um futuro empregador(?), vistas as coisas, de uma maneira rápida, a indemnização é assim a modos como um prémio de produção. Finalmente: um olho no ordenado outro na indemnização. Bem bom, falta de vergonha na cara: nenhuma.

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Ilustração António Gaspar

 

 

Uma história verídica, em qualquer prateleira perto de si

Petiscos de Portugal 2022

26
Out22

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Para acrescentar: que esta iguaria é feita e produzida em Rabo de Peixe, Açores, por cerca de duzentas mulheres conserveiras que ganham o salário mínimo, sem "direito" a subida de categoria, mesmo após décadas a exercer a profissão, para que fique claro, a subida de categoria não é mais do que 30 euros para quem tem mais de seis anos de serviço, e 45 euros para os restantes anos, valores esses que ainda estão por usufruir, ou seja apesar de se vender o produto a preços "confortáveis", digamos assim, o ordenado nunca mexe, assim quando comerem o atumzinho lembrem-se que: é feito em Rabo de Peixe, Açores, e pagam uma miséria aos trabalhadores

Dia da Mãe, Dia do Trabalhador

Maio mês do coração

01
Mai22

 

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Hoje assinala-se o dia da mãe e simultaneamente  o dia do trabalhador, em resumo começa também o mês dedicado ao coração, sem dúvida que estas duas dimensões da nossa vida - a mãe e a trabalhadora -  são grandes alavancas para fazer bombear o nosso coração, numa e noutra poderemos encontrar alegrias e tristezas que podem afectar, para o bem ou para o mal, o nosso coração. Cuidar do nosso coração exige esforço e equilíbrio entre estas duas áreas, e também naquilo que somos, o Eu - num acto torna-mo-nos três em um - somos o eu, a mãe e a trabalhadora. Descurar o eu não é tido muitas das vezes em conta, porque as outras duas dimensões agigantam-se de tal maneira que o eu revela-se apenas um apêndice.

Sabemos que trabalhar é um meio de sobrevivência, para nós e para as crias, ser mãe é também um acto de sobrevivência da espécie, que numa analogia poderá ser comparado a um salto de paraquedas, sabemos que vamos saltar, só não sabemos como vai correr, é inevitável, avassalador, incrível, assustador. Não haverá receita mágica para ser-se a melhor mãe, porque é um trabalho sem finitude, não há descanso no pensamento, nem no coração, fisicamente exigente vinte e quatro horas por dia.

Trabalhar poder-se-à reduzir-se a um mero horário, mas não é só isso, poucos são os que trabalham naquilo que gostam, como podemos proteger o nosso coração fazendo algo que não gostamos(?).

É muito difícil manter-mo-nos saudáveis nestas duas dimensões da nossa vida, alguma há-de falhar, ou resultar menos bem, se antes carregámos um mundo na barriga, agora sentimos que carregamos um mundo às costas.  

Em Portugal, apesar da Lei abranger o direito parental, ainda assistimos à discriminação salarial entre homens e mulheres, e sendo que um dos factores de discriminação é o facto de a mulher ser mãe ou vir querer a sê-lo, no nosso país a taxa de natalidade tem vindo a baixar, se por um lado isto deve-se aos baixos salários, também se deve às condições de empregabilidade onde vão sendo cada vez mais os horários desfasados com o seio familiar.

Ser-se mãe em Portugal é desgastante, exigente e por vezes humilhante em meio laboral e social, ainda não existe cultura social e política em benefícios que superem o ser-se mulher - mãe - trabalhadora.  Apenas o coração supera isso.

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