Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

Alice Alfazema

Recortes do quotidiano: do meu, do teu, do seu, e dos outros.

Alice Alfazema

Recortes do quotidiano: do meu, do teu, do seu, e dos outros.

Micro contos: À pesca de comentários

06
Set23

Penteou-se e alisou automaticamente os cabelos compridos, aquela escova nova fazia maravilhas, olhou-se ao espelho como que para conferir a tonalidade dos cabelos, ligou então o telemóvel, verificou o plano, parecia razoável, as lágrimas começaram-lhe a cair pela cara, falou para a lente algo e enviou o vídeo para a rede. Ficou então a aguardar os comentários. 

Futuro

Árvore de Natal

10
Dez22

maria.jpg 

Ilustração Clint Cearley

Trouxe as palavras e colocou-as sobre a mesa.
Trouxe-as dentro das mãos fechadas (alguns disseram
que apenas escondia as feridas do silêncio).

Pousou-as na mesa e começou a abri-las devagar,
tão devagar como passa o tempo quando o tempo
não passa. E depois distribui-as pelos outros,
multiplicou-se em dedos, em palavras (alguém disse
que chegariam a todos, ultrapassariam os séculos e
teriam a duração do tempo quando o tempo perdura).

Ceou com todos pão que não levedara e vinho áspero
das videiras magras do monte que os ventos dizimavam.
Quando se ergueu, havia ainda palavras sobre a mesa,
coisas por dizer no resto do pão que alguém deixara,
feridas fundas nas mãos que fechou em silêncio e devagar.

Perto dali uma figueira florescia. À espera.

 

Poema Maria do Rosário Pedreira

Plantação de coronavírus

10
Set22

A partir de uma certa idade, isto é como quem diz, depois de uns cabelos brancos, de umas peles flácidas, e por aí fora, ficamos a entender que está tudo escrito na natureza, e que a nossa espécie pouco ou nada inventou, bem talvez aquilo que inventámos de raiz tenha sido a malvadez e um deus que não ama o macho e a fêmea da mesma forma.