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Alice Alfazema

Recortes do quotidiano: do meu, do teu, do seu, e dos outros.

Alice Alfazema

Recortes do quotidiano: do meu, do teu, do seu, e dos outros.

Daqui até ao Natal - 7

25
Ago24

IMG_20240725_110329.jpg 

Se tudo que se pode revestir
da couraça inconsútil da palavra
fosse algo mais que um vácuo protegido
[...] falar seria sempre dizer,
dar nome à coisa não seria mais
que ver na superfície da semente
a planta por nascer; e a sensação
incômoda de estar a todo instante
em algum lugar – isso seria ser.


Paulo Henriques Britto, in Dos nomes 

 

Na verdade nunca entendi o menosprezo, de algumas pessoas, pelas pequenas coisas que nos acontecem no dia a dia, não fossem esses momentos os verdadeiros alicerces daquilo que nos sustem. O ridículo é chegar-se à recta final e ver que afinal os clichés são um padrão pelo qual temos de passar, por mais que alguém queira ser especial e único. 

O que é ser-se especial e único? É complicar, problematizar as escarpas das horas vagas? Tal e qual como o feitio especial, termo que geralmente se usa para definir e desculpar uma pessoa bera. E mais - a frontalidade, tema muito em voga, igualmente disfarçada de linguajar bruto, sem olhar a meios, como se os meros ouvintes fossem todos estúpidos. 

De repente torna-se ridículo quem não é especial, quem não responde, como se o silêncio não fosse ele também um cliché.

 

Daqui até ao Natal -1

19
Ago24

Daqui até ao Natal não sei quantos dias são, o tempo a longo prazo tornou-se pouco importante, sendo o tempo uma coisa vaga que se agiganta - naquilo que for - quando menos gostamos, e diminui na proporção da sua importância motivadora e inspiradora, quer em termos intelectuais ou emocionais. O tempo como aquele pedacinho de um instante, como cometa de mil cores que parece passar suave perante a nossa admiração, num fascínio milenar,  maravilhosamente encantador, que deixa cá dentro deste corpo terreno a imensidão do cosmos, tal como uma música que trespassa a pele e se incorpora na mais ínfima das células, para depois explodir como se fosse um bola de sabão, deixando salpicos finos como prova da sua brevíssima existência.

O tempo marca a existência deste blog há mais de quatorze anos, digitalmente um tempo longo, na realidade apenas um piscar de olhos, foram tantos os dias, numa velocidade furiosa e incontrolável a ampulheta da vida não pára, parecendo maior o espaço vazio e mais cheio aquilo que já foi, no entanto, o que resta assume uma importância maior, como num final de fogo de artifício, depois o silêncio, ou o vazio do som das cores e das luzes, vamo-nos então suavemente, tal como rastos de estrelas visiveis numa noite de Verão. 

 

Há dez anos neste blog, registei a velocidade, e o Poeta Zarolho comentou dizendo: Velocidade da luz apenas alcançável por mentes brilhantes, como Einstein. Interessante a velocidade e o tempo caminham lado a lado. Fui então visitar o blog do Poeta Zarolho, e vi que o tempo parou por lá desde 2021, fico a pensar no que se passou desde então, e não sei nada, porque de repente somos e depois já não somos. 

 

Estou aqui à beira mar

Estou aqui à beira mim

Nesta arte de abeirar

Sigo apenas porque sim

 

Sinto as brisas falar

Sei porque falam assim

Limito-me a escutar

Desconto o que é ruim

 

Sou aquilo que sonhei

E mesmo nada sabendo

No dia em que acordei

 

Logo fui percebendo

Que sabendo, nada sei

Que sem ser, lá fui sendo.

 

Poema retirado do Blog Poeta Zarolho

A fúria do açúcar

08
Out22

IMG-20221007-WA0001.jpegSinto saudades de algumas pessoas que tinham blogs, é que mesmo sem as conhecer pessoalmente, ou virtualmente, sem ter noção do seu rosto ou do seu corpo, sinto saudades das suas palavras escritas, que é como quem diz: da conversa posta avulso, sem esperar comentários, das opiniões e dos desabafos que ou fim e ao cabo são comuns a todos, a uns mais que a outros. 

As saudades de outros escritos, das viagens contadas como fôlegos quentes, daqueles que deixam vapor nos espelhos, dos diálogos banais que identificamos também como nossos, do quotidiano em paralelo que encolhe a solidão, enfim da vida posta em palavras sem som, naquilo que nos une ou nos afasta, sem filtros (como agora se diz, deixa-me rir, que se inventam palavras e expressões para assuntos velhos, é nestas alturas em que me sinto um dinossauro a ruminar demoradamente umas folhas de palmeira nuns trópicos virtuais).

E aqui estou eu, na fúria do açúcar, partilhando uns suspiros escritos em frases pronunciadas num teclado. Há quem assuma que os suspiros são tristeza de um canto da alma, alguns são suspiros vindos do coração, respiração profunda, coisa que refresca o ânimo, ou um suspiro de inspirar aquele cheiro que queremos guardar bem dentro de nós, um suspiro é "um básico" no armário da recordação.

 

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