Coisas do nosso tempo - Dragagens no Sado
Golfinho roaz do Sado. Ainda há alguma esperança que as dragagens não avancem. Eles agradeciam, todos nós agradecíamos.....Setúbal, Portugal.
Fotografia e texto Pedro Narra
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Golfinho roaz do Sado. Ainda há alguma esperança que as dragagens não avancem. Eles agradeciam, todos nós agradecíamos.....Setúbal, Portugal.
Fotografia e texto Pedro Narra
O navio Libertas continua o seu périplo pela barra e estuário do Sado, fazendo as medições finais necessárias à intervenção das dragas.
Depois de sondar todo o canal de navegação, esteve nas últimas horas a cobrir por completo o local a que a APSS e a DGRM deram o nome de "polígono de TUPEM nº 30/01/2019" e que entendem ser o ideal para depositar 2,6 milhões de metros cúbicos de sedimento onde as análises do IPMA identificam contaminações de classe 1, 2 e 3 de componentes como o mercúrio, cádmio ou hidrocarbonetos aromáticos policíclicos.
Para compor o cenário de terror, estas análises do IPMA são apontadas por diferentes pareceres técnicos como sendo insuficientes e menosprezadoras do grau de contaminação e risco envolvidos, para além de não terem em conta os potenciais riscos da mistura destes componentes pela acção de dragagem.
Quem vive o Sado, e sobretudo quem vive do Sado, conhece esta zona por outro nome: a restinga de Tróia. Sabe que é ali que nasce muita da vida que torna o estuário do Sado tão especial. E também sabe que - como previsto no próprio Estudo de Impacte Ambiental - a deposição de dragados poderá causar impactes irreversíveis na regeneração das espécies que fazem da restinga a sua maternidade e que garantem a riqueza e qualidade do pescado da região, famoso além-fronteiras.
É esta irreversibilidade que tem causado tanta polémica, e motivou uma fortíssima oposição à deposição por parte da comunidade piscatória de Setúbal.
A esta revolta, a APSS respondeu à saciedade que não faria qualquer utilização da licença obtida “até que exista uma solução de consenso com os pescadores”, num gesto pretensamente magnânimo que só poderia nascer da mente tortuosa de quem se julga dono dos recursos naturais e da biodiversidade da região, e que deles pode servir-se como moeda de troca para avanço dos seus interesses.
No dia em que tomam posse os deputados eleitos na recente eleição legislativa, lembramos um assunto que tem ficado esquecido nas mesas de trabalho das comissões parlamentares e do plenário da Assembleia da República: Mais de 13 mil cidadãs e cidadãos continuam à espera de respostas acerca do perigo para o equilíbrio ecológico e a saúde e bem-estar públicos que as obras de dragagens previstas no rio Sado auguram.
A entrega em Janeiro da petição "Pela defesa da Reserva Natural do Estuário do Sado” à Assembleia da República suscitou a audição da primeira subscritora na Comissão Parlamentar do Ambiente em Março, tendo aí sido relevados os graves riscos da obra descritos no Estudo de Impacte Ambiental e considerados subavaliados pela Comissão de Avaliação do mesmo.
Foram ainda feitas revelações sobre a falta de transparência do processo e ausência de esclarecimentos e auscultação pública por parte da APSS, o evidente incumprimento de várias obrigações da Declaração de Impacte Ambiental do projecto e a falta de informação que justificasse o avançar do projecto.
Estas afirmações obtiveram concordância por parte das forças políticas presentes, sendo na altura solicitado à APSS o estudo económico da obra, que sabemos hoje não ter sido entregue à Agência Portuguesa do Ambiente para apreciação mas que foi mesmo assim assumido como factor “determinante” na aprovação do projecto.
O número de subscritores da petição obriga à sua discussão em plenário da Assembleia da República, tendo a mesma sido remetida para esse passo pela respectiva comissão parlamentar, mas até hoje não houve qualquer iniciativa nesse sentido. Agora que a APSS anuncia o início das dragagens, o silêncio de São Bento torna-se mais ensurdecedor que nunca.
Relembramos assim às novas deputadas e deputados a importância de ouvir as legítimas preocupações da população e garantir o correcto e atempado funcionamento dos mecanismos democráticos.
A causa da defesa do património natural português é demasiado importante para ficar perdida… Nos Passos Perdidos da Assembleia da República!
Petição em https://participacao.parlamento.pt/initiatives/432