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Alice Alfazema

Recortes do quotidiano: do meu, do teu, do seu, e dos outros.

Alice Alfazema

Recortes do quotidiano: do meu, do teu, do seu, e dos outros.

Maio maduro maio

o trabalho digno

01
Mai23

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Maio, maduro maio, vai quase a meio o ano de trabalho, o que fizemos (?), o que podemos ainda fazer(?), o que gostaríamos de fazer(?), o que ganharíamos se fizéssemos (?), o que não ganharíamos se o fizéssemos (?). Uma dimensão acre e doce, assim é o mundo do trabalho.

Uma parte do nosso dia é passado a trabalhar,  como tal é de grande importância a forma como vemos e vivemos o Trabalho na nossa vida. A forma de trabalhar sofreu grandes transformações ao longo dos tempos, de essencialmente manual o trabalho chega aos nossos dias bastante mecanizado, muitos deixaram de ter colegas de trabalho e passaram a ter máquinas como companheiros de jornada, talvez os dias se tenham tornado mais monótonos, silenciosos em vozes, mais acelerados na medida do tempo, quase sempre numa adaptação desigual entre a máquina e o humano. 

O que aprendemos hoje não nos dá para quase nada, ou ano, dois anos talvez, cinco no máximo, aquele conhecimento que dava para a vida toda acabou, porque o mundo do trabalho tornou-se global, assim como o conhecimento e a aprendizagem. 

 

Possivelmente a grande maioria das pessoas não encontra grande satisfação no trabalho, ou porque a novidade acabou e instalou-se a monotonia, ou porque se está insatisfeito com o salário ganho, ou porque não gosta dos colegas de trabalho, ou o chefe é insuportável, ou porque despende demasiado tempo no caminho percorrido da casa trabalho e trabalho casa, ou porque sente remorso e culpa de não ter tempo de qualidade para utilizar com a família e amigos, enfim cada qual em motivo da dimensão que dá ao trabalho poderá ter uma ou várias razões para se sentir insatisfeito com o trabalho que tem. 

Mas o que tem o trabalho em relação a um Maio maduro (?), o trabalho provoca na pessoa o amadurecimento que o mês de maio provoca no cereal, dá fruto, sempre dá fruto, mesmo que o fruto não seja doce e o esperado. Do trabalho nasce o caminho, e a importância dele é quase sempre uma escolha de cada um, dedicamos ao trabalho grande parte do nosso dia, portanto é um caminho obrigatório, dependemos dele para sobreviver e viver.

Será o trabalho um caminho largo ou apenas um carreiro estreito e sinuoso(?), depende muitas vezes da nossa condição mental, e da forma como decidimos vivê-lo. 

No começo desse caminho estamos nós a dar os primeiros passos, tal como crianças vamos a medo, fazendo pequenas e grandes descobertas, ao fim de algum tempo já não somos os mesmos e queremos mudar, porque aquilo já não nos satisfaz, porque aquilo já nada nos diz, porque queremos aprender e sentir outra vez o gosto da descoberta, e o que fazemos tantas vezes (?), ficamos ali, no mesmo caminho, sem sequer dar um passo para mudarmos. Não é sair da nossa zona de conforto, porque essa esbateu-se, mas é alargar essa zona de conforto, e como (?), fazendo formação, aprendendo novas matérias, descobrindo em nós novos desejos e habilidades, talvez concretizando um desejo antigo, e o que nos impede (?), são as vozes negativas que temos em nós, são as que escutamos dos outros, são as crenças que bebemos da sociedade, coisas vagas que se tornam grandes no  nosso subconsciente, e o que nos impede de continuarmos (?), a falta de acção concreta, não é tentar, é fazer, não é dizer, é fazer, não é culpar e desculpar, é agir, porque sou novo (?) e daí (?), a experiência é uma semente que cresce, porque sou velho (?), e daí (?), o que aprendeste tem ou não tem valor (?), porque sou pobre (?), e o conhecimento conhece pobres ou ricos (?), o que depende de ti não depende de outros, o que fazes por ti outros não farão.

Nunca é tarde para mudarmos de trabalho, mesmo que te digam que é ridículo não acredites, mesmo que te digam que já não tens idade para mudanças que implicam novos conhecimentos, isso é mentira, mesmo que insinuem que não vais conseguir, isso é pressupostos dos outros, mesmo que te digam que é difícil, isso já sabes, não é novidade, mesmo que relatem que o mundo agora é diferente, lembra-te: que tu também já não és mais o mesmo. Todos temos em nós os recursos necessários, não te limites, o trabalho é todo teu, o esforço é todo teu, a satisfação é impagável e será somente tua. 

Desejo-vos um excelente Maio, que ele seja prospero em ideias e projectos novos, tal como os campos precisam de ser lavrados para dar inicio ao plantio e colheita, também nós precisamos do conhecimento e da aprendizagem constante para darmos fruto e semente.

 

 

 

 

Dia da Mãe, Dia do Trabalhador

Maio mês do coração

01
Mai22

 

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Hoje assinala-se o dia da mãe e simultaneamente  o dia do trabalhador, em resumo começa também o mês dedicado ao coração, sem dúvida que estas duas dimensões da nossa vida - a mãe e a trabalhadora -  são grandes alavancas para fazer bombear o nosso coração, numa e noutra poderemos encontrar alegrias e tristezas que podem afectar, para o bem ou para o mal, o nosso coração. Cuidar do nosso coração exige esforço e equilíbrio entre estas duas áreas, e também naquilo que somos, o Eu - num acto torna-mo-nos três em um - somos o eu, a mãe e a trabalhadora. Descurar o eu não é tido muitas das vezes em conta, porque as outras duas dimensões agigantam-se de tal maneira que o eu revela-se apenas um apêndice.

Sabemos que trabalhar é um meio de sobrevivência, para nós e para as crias, ser mãe é também um acto de sobrevivência da espécie, que numa analogia poderá ser comparado a um salto de paraquedas, sabemos que vamos saltar, só não sabemos como vai correr, é inevitável, avassalador, incrível, assustador. Não haverá receita mágica para ser-se a melhor mãe, porque é um trabalho sem finitude, não há descanso no pensamento, nem no coração, fisicamente exigente vinte e quatro horas por dia.

Trabalhar poder-se-à reduzir-se a um mero horário, mas não é só isso, poucos são os que trabalham naquilo que gostam, como podemos proteger o nosso coração fazendo algo que não gostamos(?).

É muito difícil manter-mo-nos saudáveis nestas duas dimensões da nossa vida, alguma há-de falhar, ou resultar menos bem, se antes carregámos um mundo na barriga, agora sentimos que carregamos um mundo às costas.  

Em Portugal, apesar da Lei abranger o direito parental, ainda assistimos à discriminação salarial entre homens e mulheres, e sendo que um dos factores de discriminação é o facto de a mulher ser mãe ou vir querer a sê-lo, no nosso país a taxa de natalidade tem vindo a baixar, se por um lado isto deve-se aos baixos salários, também se deve às condições de empregabilidade onde vão sendo cada vez mais os horários desfasados com o seio familiar.

Ser-se mãe em Portugal é desgastante, exigente e por vezes humilhante em meio laboral e social, ainda não existe cultura social e política em benefícios que superem o ser-se mulher - mãe - trabalhadora.  Apenas o coração supera isso.

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Mulher Maio

01
Mai21

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Ilustração  Iker Ayestaran

 

 
Bom dia minha amiga digo em Maio
és uma rosa à beira dum tractor
neste campo de Abril onde não caio
a nossa sementeira já deu flor.
 
Bom dia minha amiga eu sou um gaio
um pássaro liberto pela dor
tu és a Companheira donde saio
mais limpo de mim próprio mais amor.
 
Bom dia meu amor estamos primeiro
neste tempo de Maio a tempo inteiro
contra o o tempo do ódio e do terror.
 
Se tu és camponesa eu sou mineiro.
Se carregas no ventre um pioneiro
dentro de ti eu fui trabalhador.
 
 
 
Poema de José Ary dos Santos
 
 
 

Uma reflexão no Dia do Trabalhador

01
Mai19

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Ilustração Giuseppe Pelliizza

 

Antigamente, na generalidade, os trabalhadores laboravam em fábricas, na pesca, ou na agricultura, andavam rotos, sujos e descalços porque eram mal pagos e  mal vistos. Eram pessoas que não sabiam de nada, ranhosos, não letrados. Depois vieram os trabalhos de escritório, trabalhos de responsabilidade, melhor pagos, as pessoas passaram a vestir-se melhor, e a distanciarem-se dos rotos e sujos. Apareceram os chefes e os directores e os lambe botas. E o mundo melhorou a olhos vistos. E as pessoas esqueceram-se das lutas laborais e apenas conhecem os direitos que agora têm. 

 

Os anos passaram e agora temos um grande leque de profissões, umas muito bem pagas, vistas como extremamente importante pela sociedade, outras nem tanto, existem ainda outras que são  descartáveis. A outras foram dado termos como: colaboradores. A luta por melhores direitos laborais passou a ser mal vista pelos próprios trabalhadores. Entrar a horas no emprego e sair sempre depois da hora laboral é visto como um exemplo divinal de colaborador, mesmo que o querubim tenha andado na ronha durante o dia. Portanto a aparência é da maior importância. A forma como nos vestimos, falamos e nos apresentamos no nosso local de trabalho faz de nós um modelo, bom ou mau.  E tal como no princípio das lutas continuam a haver os chefes os directores e os lambe botas. 

 

O trabalho é uma alavanca para a subida na estratificação social, porque nele está contida não só a valorização social de cada pessoa que o concretiza, como a quantificação monetária que faz com que seja possível essa subida. Tal como um bolo de camadas em que a última é a melhor e a primeira é a que está esborrachada. Se está esborrachada não presta para nada. Ninguém quer ser a primeira camada que está em baixo. A primeira é a mais mal paga: imagine-se, ninguém precisa que se limpem sanitários? É verdade que todos cagam, mas é dispensável um ordenado digno, portanto ordenado de merda para trabalho de merda, essas pessoas que se sujeitam a este tipo de trabalho provavelmente não sabem fazer mais nada? É o que pensa a generalidade das pessoas. Não estudaram? Isto é o que deixa transparecer o preconceito social. E se todos tivessem estudado muito? Será que o trabalho de limpar a merda dos outros seria considerado prestigiante e mais bem pago? Ou andaríamos todos a boiar na merda?