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Alice Alfazema

Recortes do quotidiano: do meu, do teu, do seu, e dos outros.

Alice Alfazema

Recortes do quotidiano: do meu, do teu, do seu, e dos outros.

10

10
Mar21

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Quer seja curto ou comprido
Quer seja fino ou mais grosso
É um órgão muito querido
Por não ter espinhas nem osso
 
De incalculável valor
Ninguém tem um a mais
E desempenha no amor
Um dos papéis principais

 

 

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Quando uma dama aparece
Ei-lo a pular com fervor
Se é um rapaz, estremece
Se é velho, tem pouco vigor
 
O seu nome nao é tão feio
Pois tem sete letrinhas só
Tem um R e um A no meio
Começa em C e acaba em O

 

 

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Nunca se encontra sozinho
Vive sempre acompanhado
Por outros dois orgãozinhos
Junto de si, lado a lado
 
O nome destes porém
Não gera confusões
Tem sete letras também
Tem L e acaba em ÕES
 
Prá acabar com o embalo
E com as más impressões
Os órgãos de que eu falo…
São o coração e os pulmões.
 
 
 
Poema é de Manuel Maria de Barbosa du Bocage, as ilustrações de Fernando Vicente

 

 

Bocage o Elmano Sadino

15
Set19

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Lá quando em mim perder a humanidade
Mais um daqueles, que não fazem falta,
Verbi-gratia - o teólogo, o peralta,
Algum duque, ou marquês, ou conde, ou frade:

Não quero funeral comunidade,
Que engrole sub-venites em voz alta;
Pingados gatarrões, gente de malta,
Eu também vos dispenso a caridade:

Mas quando ferrugenta enxada idosa
Sepulcro me cavar em ermo outeiro,
Lavre-me este epitáfio mão piedosa:

"Aqui dorme Bocage, o putanheiro;
Passou a vida folgada, e milagrosa;
Comeu, bebeu, fodeu, sem ter dinheiro."

 

 

Poema de Bocage, nascido em Setúbal a 15 de Setembro de 1765

Aniversário de Bocage - Autoretrato

15
Set13


Magro, de olhos azuis, carão moreno,
Bem servido de pés, meão na altura, 
Triste de facha, o mesmo de figura,
Nariz alto no meio, e não pequeno:

Incapaz de assistir num só terreno,
Mais propenso ao furor do que à ternura,
Bebendo em níveas mãos por taça escura
De zelos infernais letal veneno:

Devoto incensador de mil deidades,
(Digo de moças mil) num só momento
Inimigo de hipócritas, e frades:

Eis Bocage, em quem luz algum talento:
Saíram dele mesmo estas verdades
Num dia, em que se achou cagando ao vento.


Bocage
Ver mais aqui.
Alice Alfazema

Os Gatos de Bocage

15
Set12

Bocage nasceu em Setúbal a 15 de Setembro de 1765, reza a história que tinha um temperamento irreverente com um sentido de humor difícil de discernir, sendo,  também um defensor da igualdade, fraternidade e liberdade. Este texto que se segue está perfeitamente enquadrado na situação que se vive actualmente, querendo isso dizer que, apesar de já terem passados tantos anos, as desigualdades sociais persistem, e persistem pelas mesmas fúteis razões.

 

 

 

 

Dois bichanos se encontraram

Sobre uma trapeira um dia.

(Creio que não foi no tempo 

Da amorosa gritaria).

 

De um deles todo o aconchego

Era dormir no borralho,

O outro em leito de Senhora

Tinha mimoso agasalho.

 

Ao primeiro o dono humilde

Espinhas apenas dava;

Com esquisitos manjares

O segundo se engordava.

 

Miou e lambeu-o aquele

Pelo ver da sua casta:

Eis que o brutinho orgulhoso

De si com desdém o afasta.

 

Aguda unhada vibrando,

Lhe diz:"Gato vil e pobre,

Tens semelhante ousadia

Comigo opulento e nobre!

 

Cuidas que sou como tu?

Asneirão, quanto te enganas!

Entendes que me sustento

De espinhas ou barbatanas?

 

Logro tudo o que desejo,

Dão-me de comer na mão,

Tu lazeiras e dormimos

Eu em cama tu no chão.

 

Poderás dizer-me a isto

Que nunca te conheci,

Mas para ver não minto

Basta-me olhar para ti."

 

"Ui!" (Responde-lhe o gatorro,

Mostrando um ar de estranheza)

"És mais do que eu! Que distinção

Pôs em nós a Natureza?

 

Tens mais valor? Eis aqui

A ocasião de o provar."

"Nada,(acode o cavalheiro)

Eu não costumo brigar."

 

"Então" (torna-lhe enfadado 

O nosso vilão ruim)

"Se tu não és mais valente,

Em que és superior a mim?"

 

"Tu não mias?" - "Mio." "E sentes

Gosto de pilhar algum rato?"

"Sim." - " E o comes?" - " Oh se o como!"

"Logo não passas de um gato.

 

Abate, pois, esse orgulho,

Intratável criatura:

Não tens mais nobreza que eu, 

O que tens é mais ventura."

 

 

in, Bocage, Fábulas de Bocage




Alice Alfazema