As bolas e as riscas
Estive a arrumar uma estante e fico sempre surpreendida com o lixo que acumulo. Nestes últimos tempos tenho conseguido livrar-me de bastantes coisas, o truque é fazer aos poucos, e deitar fora sem pensar, mais ou menos como quando esprememos uma borbulha, dói, mas tem de ser. O pior é que eu dantes nem acumulava nada, na Primavera fazia uma razia, agora é isto, mas não pode ser. Para além disso não tenho comprado coisas inúteis. Apenas o indispensável. Há meses que não coloco brincos, nem perfume. E são coisas das quais gosto, mas parece-me demasiado: brincos e máscara. Máscara e perfume. Não dispenso no entanto os cremes: mãos, rosto, corpo. Isso faz-me sentir feliz. Pele seca é pele nua.
Esta semana foi diversificada, houve trovoada, chuva, imenso calor, e agora o vento uiva na minha janela. A normalidade dos dias é feita com o acompanhamento das notícias sobre a pandemia, todos os dias se revelam os números dos mortos pela COVID-19, às vezes até me dá a sensação que estão a dar um sorteio, e fico a pensar: poderiam acrescentar os que morrem de coração, de problemas respiratórios devido à poluição, de cancro, de fome, de conflitos armados...enfim colocavam uma lista de todos os tipos de mortes para podermos comparar e através dessa leitura de dados poderíamos criar estratégias para diminuí-las, ou quem sabe erradicá-las. É só uma ideia.
Parece-me que este nosso mundo anda a precisar de uma grande arrumação, isto de varrer o lixo para debaixo do tapete já deu o que tinha a dar. Amanhã tenho uma montanha de roupa por passar. A quem é que interessa isso? A mim, só e simplesmente a mim. É tal e qual o mal do mundo, cada um preocupa-se com o seu.
Ilustrações de Elena Vavilina