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Alice Alfazema

Recortes do quotidiano: do meu, do teu, do seu, e dos outros.

Alice Alfazema

Recortes do quotidiano: do meu, do teu, do seu, e dos outros.

No tempo das nêsperas

22
Mai21

nespera.jpg

Ilustração Maki Hasegawa

Estamos no tempo das nêsperas, enquanto os dias se alongam calmamente, as nêsperas são como pequenos sois que anunciam a chegada do Verão, com uns caroços que nos deixam as mãos pegajosas e o seu sumo é  capaz de deixar nódoas na roupa dos mais incautos.

Na casa da minha avó havia uma nespereira que dava cachos de nêsperas doces, grandes e redondas, as melhores eram sempre as inalcançáveis à mão, os pássaros mais atrevidos deliciavam-se com elas. Quando o tempo começava a aquecer o meu avô pintava a parte de baixo do tronco com cal, dizia que assim os gatos não mijavam no tronco, nunca cheguei a saber se era realmente verdade. Achava bonito ver assim a árvore engalanada, era sinal que a época das assadas iria começar. Em dias de pescaria que se avizinhavam de pingo no pão, assávamos carapaus manteiga e sardinhas no quintal, comíamos então debaixo de um toldo feito com um cobertor azul claro já velho e fino que era pendurado por cima dos estendais da roupa, a velha mesa de madeira saía para o meio do quintal, os bancos altos de madeira eram os mais cobiçados. Num instante a pinha acendia o lume, nunca compreendi como a minha avó conseguia tal proeza, colocavam-se os pimentos a assar no lume forte, fazia-se entretanto a salada, as batatas já estavam cozidas, mas ainda aconchegadas no calor do tacho. O peixe ia para a grelha, mas antes uma cebola cortada às rodelas era colocada por cima do carvão em brasa, para evitar que se levantasse labaredas,  ou em vez disso uma sardinha fazia o mesmo efeito. Fatias de pão grandes e gordas começavam a ficar ensopadas na gordura do peixe, para no fim colocarmos na grelha e comermos o pão torrado. Bebíamos sempre limonada fresca e com muito gelo, adoçada com açúcar amarelo, muito para ficar doce. Depois no final e para sobremesa nêsperas colhidas ao gosto do freguês.

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