Inverno branco
Fotografia Daisy Gilardini
Era uma vez uma foca branca, tão branca como a alva neve, fofa como os flocos que se amontoaram no velho glaciar meio desfeito, nasceu duma foca cinzenta, que não sabia quem bem quem era o pai da sua cria, eram uma família disfuncional, a mãe saía durante longos períodos para conseguir trazer-lhe algum peixe, e o suposto pai andava por ali a fazer olho grande às outras fêmeas. De vez em quando lá conseguia convencer uma delas. O grau de parentesco entrelaçava-se em cada olhar, ali todos eram meio-irmãos.
Um dia a mãe deixou de lhe alimentar, apaixonou-se por outro macho que andava por ali a rondar a eira. Era um macho coxo e gordo, de um cinzento caca assustador, com algumas cicatrizes no focinho, mas como o amor é cego, e ele possuía a melhor rocha dos cinquenta metros quadrados mais próximos, os dois juntaram as patas e foram viver juntinhos, ele fez-lhe uma cama com algas e saltou-lhe para cima, foram dois minutos de puro martírio.
E a foca branca? A foca branca é agora estrela de um reality show, onde mais focas brancas e fofinhas vivem vinte e quatro horas sobre vinte e quatro horas todas juntas, na esperança de fazerem presenças na disco Mar Bravo do Sul.