Entre a aguarela e a poesia
Tenho em casa um piano azul
E não conheço uma só nota.
Ele fica no escuro à porta do porão,
Desde que o mundo decaiu.
Tocado a quatro mãos-estelares
– A mulher-lua cantava no barco –
Hoje os ratos dançam sobre as teclas.
O teclado está quebrado…
Eu choro pelos mortos azuis.
Ah anjo amado
– eu comi do pão azedo –
Enquanto ainda estou viva
Eu lhe peço – embora seja proibido –
Abra pra mim as portas do céu.
Ilustrações Victoria Kirdy
Poema de Else Lasker-Schüler (1869–1945), poeta alemã e judia. Viveu em Berlim até à chegada de Hitler ao poder, em 1933.
Escorrem as cores vivas e alegres pelo pincel, onde se desenham cenas alegres e tranquilas, escorrem palavras negras cobertas de desespero, descem pela caneta que treme na mão. No mundo escorrem lágrimas nos rostos sujos que transmitem o medo, que mostram a fome. Escorrem laivos de loucura naqueles que olham para o lado.
Alice Alfazema