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Alice Alfazema

Recortes do quotidiano: do meu, do teu, do seu, e dos outros.

Alice Alfazema

Recortes do quotidiano: do meu, do teu, do seu, e dos outros.

Diário dos meus pensamentos (37)

25 de Abril 2020

25
Abr20

cravoarcoíris.jpg

 

Ilustraçao André Carrilho

 

Amigo
Maior que o pensamento
Por essa estrada amigo vem
Não percas tempo que o vento
É meu amigo também
Em terras
Em todas as fronteiras
Seja bem vindo quem vier por bem
Se alguém houver que não queira
Trá-lo contigo também

Aqueles
Aqueles que ficaram
(Em toda a parte todo o mundo tem)
Em sonhos me visitaram
Traz outro amigo também

 

 

 

Zeca Afonso

Chá de violetas (3)

José Silva Costa

25
Abr20

chá de violetas.jpg

 

Hoje é um dia único, é dia 25 de Abril e estamos num Estado de Emergência, por causa de um vírus que nos obriga a estar em casa e a festejarmos trancados o dia dedicado à Liberdade, hoje este chá de violetas, é servido ao José Silva Costa, que veio visitar-me e trouxe-me um presente muito especial, como sabem eu venero a Serra da Arrábida, que tem recantos mágicos, cheiros inesquecíveis, e memórias que jamais voltarei a viver, esta será mais uma recordação que irei juntar às muitas que tenho da Serra.  O José calçou as botas cardadas e inesperadamente voltou também ele a este lugar mágico, trazendo consigo as suas memórias e o seu testemunho em forma de fado, sobre um pedaço da sua vida, que fez parte da sua mocidade, e transformou para sempre a sua vida e direi eu -  os seus sonhos. Um cravo também para este homens que viveram a Guerra do Ultramar, a maioria sem saber ao que iam. 

 

Foi  a última etapa da preparação para a Guerra Colonial, em 1969, antes de ir para Angola.

 

IMG_8343.JPG

 

Fado
Foi na bela Serra da Arrábida, que me coube a conclusão
Da dura preparação, para a guerra, onde não queria a minha inclusão
Nela, acampamos por umas semanas
Lá no cimo, por cima do Portinho da Arrábida
Recusei-me a nascer antes da guerra acabar
Acabaram por, para a guerra, me mandar
Contra tudo o que fiz, para não embarcar
Numa manhã de Julho, domingo, quando as pessoas, à praia, estavam a chegar
Fizeram-nos, da Praia dos Galapos, a serra trepar, na vertical
Que Bela Serra, a da Arrábida, e a sua linda Cidade de Setúbal!
Onde na sua bela avenida, nos fizeram desfilar
Para recebermos os aplausos da despedida
De tão nobre povo que, de braços abertos, nos acolheu
Foi um ato muito triste, doloroso e honroso
Por ser, por irmos, para a guerra.

Parafrasear Bocage
Bocage, grande Bocage
O meu fado não é semelhante ao teu
Quando os cotejo
Mas, igual causa nos fez perder o Tejo.

 

José Silva Costa

 

 

Obrigada José, gostei imenso de tê-lo por cá e das palavras com que me presenteou. Esta imagem deixa antever Galapos e Galapinhos, é logo por detrás da árvore. 

 

Vizinho do blogue:

Cheia

 

25 de Abril de 1974 - 2020

25
Abr20

Eu cresci a sentir o 25 de Abril, ainda era muito miúda quando a Revolução aconteceu, lembro-me de a minha mãe ir-me buscar à escola, não era a escola primária, mas numa casa de uma antiga professora primária, eu tinha cinco anos, estávamos numa sala única, com mesas pequeninas de madeira, como se fosse uma pré-primária, havia um quadro negro e uma casa de banho minúscula, ficava num primeiro andar, daqueles em que a escada é de madeira e os degraus são demasiado estreitos e íngremes. Ali em Setúbal, na Rua da Palha, perto do Cemitério. Lembro-me de irmos à pressa para casa, de subirmos a ladeira e eu quase de arrasto pela mão da minha mãe, e de chegarmos a casa e da haver gente a entrar e a sair a toda a hora. 

 

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Lembro-me então de em Outubro entrar para a escola primária e de só ter usado bata branca durante uma semana, porque depois cada um escolhia o que queria, a minha mãe nunca me obrigou a usá-la, aliás nunca me obrigou a nada. Tínhamos rapazes e raparigas na turma. Cresci a ver os murais coloridos nas paredes das casas e das fábricas, num tempo de renascimento, num tempo em que acreditar era válido, de libertação, com canções que traziam mensagem na voz, onde em cada ano, por este dia era comprado um ramo de cravos vermelhos para pormos na mesa da sala. 

 

 

 

Há quem diga que isto é coisa de velhos, como pode a Liberdade ser coisa de velhos? A celebração do fim de um período negro da nossa História, onde tantos foram torturados pela PIDE, onde a miséria se instalava e se via na cara das pessoas, num atraso e na brutalidade daquilo que era o papel da mulher na sociedade portuguesa da altura, celebrar Abril é de uma dimensão que vai para além de todo o simbolismo de um cravo ou de uma canção. Celebrar Abril é a prova que podemos mudar as nossas vidas e a nossa sociedade. 

 

 



Esta é a madrugada que eu esperava
O dia inicial inteiro e limpo
Onde emergimos da noite e do silêncio
E livres habitamos a substância do tempo

 
 
 
Sophia de Mello Breyner Andresen

 

 

 

Abril sempre!

 

Ilustrações retiradas:

Centro de Documentação 25 de Abril, Universidade de Coimbra