Ânsia
Na semana passada um pardal entrou na minha cozinha, já era noite e o esquentador estava acesso, mesmo assim, o pássaro saiu de dentro dele ileso, não sei como, mas saiu. Escapou à panela que estava ao lume e voou pela casa. Apanhamo-lo. Fizemos, então, de uma caixa de papelão a sua casa de dormir, não mais se mexeu.
No outro dia, bem cedo, na hora em que os pardais acordam e se espreguiçam, levámos a caixa para a rua, nenhum movimento lá dentro. Na rua o chilrear dos pardais ecoava no ar. O sol sorria. Mal abri a caixa um vibrante par de asas deu um salto para o céu. Veloz, voou em direcção às árvores e eu fiquei ali a olhar aquela vontade de liberdade.
Um espírito habita a imensidade:
Uma ânsia cruel de liberdade
Agita e abala as formas fugitivas.
E eu compreendo a vossa língua estranha,
Vozes do mar, da selva, da montanha...
Almas irmãs da minha, almas cativas!
Antero de Quental, Redenção.
Alice Alfazema