25 de Abril de 1974 - 2020
Eu cresci a sentir o 25 de Abril, ainda era muito miúda quando a Revolução aconteceu, lembro-me de a minha mãe ir-me buscar à escola, não era a escola primária, mas numa casa de uma antiga professora primária, eu tinha cinco anos, estávamos numa sala única, com mesas pequeninas de madeira, como se fosse uma pré-primária, havia um quadro negro e uma casa de banho minúscula, ficava num primeiro andar, daqueles em que a escada é de madeira e os degraus são demasiado estreitos e íngremes. Ali em Setúbal, na Rua da Palha, perto do Cemitério. Lembro-me de irmos à pressa para casa, de subirmos a ladeira e eu quase de arrasto pela mão da minha mãe, e de chegarmos a casa e da haver gente a entrar e a sair a toda a hora.
Lembro-me então de em Outubro entrar para a escola primária e de só ter usado bata branca durante uma semana, porque depois cada um escolhia o que queria, a minha mãe nunca me obrigou a usá-la, aliás nunca me obrigou a nada. Tínhamos rapazes e raparigas na turma. Cresci a ver os murais coloridos nas paredes das casas e das fábricas, num tempo de renascimento, num tempo em que acreditar era válido, de libertação, com canções que traziam mensagem na voz, onde em cada ano, por este dia era comprado um ramo de cravos vermelhos para pormos na mesa da sala.




Há quem diga que isto é coisa de velhos, como pode a Liberdade ser coisa de velhos? A celebração do fim de um período negro da nossa História, onde tantos foram torturados pela PIDE, onde a miséria se instalava e se via na cara das pessoas, num atraso e na brutalidade daquilo que era o papel da mulher na sociedade portuguesa da altura, celebrar Abril é de uma dimensão que vai para além de todo o simbolismo de um cravo ou de uma canção. Celebrar Abril é a prova que podemos mudar as nossas vidas e a nossa sociedade.



O dia inicial inteiro e limpo
Onde emergimos da noite e do silêncio
E livres habitamos a substância do tempo
Abril sempre!
Ilustrações retiradas: