Será que os corações têm alma?
Ou serão meras partes de um corpo?
Ontem, fui ver e ouvir o Salvador Sobral a actuar em Palmela, gostei especialmente da sua veia de bom humor - "obrigado, senhora varredora da cultura por me ter convidado..." - foi um espectáculo polvilhado de momentos únicos, tal como o próprio disse: que não gosta de ser repetitivo e monótono - não foi - foi giro, por vezes hilariante, foi emocionante, delicado, com magia, gostei, fez-me bem, saí de lá outra.
No decurso do concerto tornou-se inevitável para mim ouvir apenas o som do canto e os acordes dos instrumentos, os meus pensamentos voavam lado a lado com as melodias ouvidas, eram rápidos e incontroláveis, por mais que quisesse - não consegui deixar de relacionar os movimentos velozes que o cantor fazia com a cabeça, enquanto descarregava a adrenalina que lhe ia na alma, com a sua fragilidade aquando do Festival Eurovisão da Canção em 2017, o qual ganhou em Kiev, na Ucrânia, desejei o mesmo para este país, que renasça.
Pensei, em como o tempo pode ser tão leve, tão leve como pó levado pela brisa.
Recordo a noticia sobre o transplante de coração feito ao artista, ironicamente pela mesma época em que faleceu a neta de uma amiga, sei que partes desse corpo foram para doação de órgãos, era um corpo jovem e saudável, tristemente perdido numa minúscula viagem de carro, lembro-me de termos falado: ela não morreu totalmente, vai andar por aí, outras pessoas irão ser felizes por causa dela.
Fica sempre a dúvida.
Dizem que é só uma parte, mas uma parte também pertence a um todo - é uma parte de uma vida que pertence agora a um todo de outra, tornada num universo transformador. Sublime essa partilha. Sentimentos vividos em paralelo, num amar pelos dois corpos, um mesmo coração.