Rastros
Ilustração Andrea Calisi
Rio
manso
rio manso
vai tranquilo
rio manso, vai descendo

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Ilustração Andrea Calisi
Rio
manso
rio manso
vai tranquilo
rio manso, vai descendo
Uma tarde Maria Cristina
obrigou-me a comer osgas
e a repetir
com a boca cheia de osgas
as pessoas sensíveis
gostam de comer osgas
mas não gostam
de ver matar osgas
por isso têm de comer
as osgas vivas
se querem fazer na vida
aquilo de que gostam
Poema de Adília Lopes
Ilustração Adrien Patout
Virar as costas, nem é sinal de fraqueza, nem de cobardia, virar as costas é simplesmente ir em frente para o futuro.
Já não sei há quanto tempo recortei estas meninas de papel e depois as pintei. No fundo elas são uma representação daquilo que podemos ser, ou da forma como vemos o mundo e nos apresentamos perante ele. Reparei agora que existe um ponto comum entre todas - o sorriso. Nunca desenhei nenhuma cara triste. E é verdade, que quando me apresento perante um problema, ou algo menos bom é no sorriso que me refugio, não me sei ver sem ele, e mesmo quando estou furiosa, num repente vejo-me com ele outra vez. Herança minha, maneira de ser geneticamente partilhada, jeito manso de resolver coisas da vida.
Ilustração Irene Fioretti
Este ano temos estado demasiado atentos aos outros e passamos muito tempo à janela. Tem sido um ano de profunda reflexão sobre os valores que queremos e dos que devemos abandonar. Não é para mim um ano desperdiçado, como tenho ouvido dizer por aí. É um patamar de mudança, se fosse um jogo, chamaríamos de - mudança de nível. Ou caímos, ou subimos, a diferença é que aqui não há como ficar no mesmo nível. Sabemos que esta janela temporal é comum e global, sabemos também que apesar de ser comum e global, ela é diferente em cada país, e em cada pedaço do globo, e não só por essa forma, ela também difere pelo bairro em que vivemos ou da cidade, pela forma como nos alimentamos, pela profissão que temos, pelo poder económico, pela idade e até o género. A imagem de que o vírus atinge todos da mesma forma não é verdadeira. Há quem tenha de se expor como um peão, outros como um bispo ou um rei. E nisto passámos a Primavera à janela, tanto na real como na janela virtual que nos permite estarmos aqui a escrever e a lermos uns e outros. A janela é um ponto de partida para o conhecimento, um ponto de vigia, de acesso, e ainda de encontro paralelo neste mundo global de desigualdades crescentes e incrivelmente ignoradas, mesmo debaixo do nosso nariz, perdão - janela. Deste modo a nossa rua (que é onde estão as nossas janelas), é alargada em proporção da população existente globalmente, e é relegada em detrimento de outros valores que continuam a sobrepor-se à sua existência, valores esses que contribuem directamente e indirectamente para aquilo que estamos a viver. Numa doença não se verificam apenas os sinais e os sintomas, muitas das vezes é nas causas que está a solução. Ou então a velha máxima: Onde? Como? Quando? Porquê?