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Alice Alfazema

Recortes do quotidiano: do meu, do teu, do seu, e dos outros.

Alice Alfazema

Recortes do quotidiano: do meu, do teu, do seu, e dos outros.

Calma e tranquilidade

30
Set19

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Se chama calma e me custou muitas tempestades. ⠀
Se chama calma e quando desaparece a busco incessantemente.
Se chama calma e me ensina a respirar, pensar e repensar. ⠀
Se chama calma e quando a loucura chega desencadeia ventos valentes que custam dominar. ⠀

 

 

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Se chama calma e vem com os anos quando a ambição da língua jovem se solta, a barriga esfria sem ânsia, dá mais silêncio e mais sabedoria. ⠀
Se chama calma e, quando você aprende a amar, quando o egoísmo se esvai e o inconformismo acaba, abre-se o coração e a alma para quem quer receber e dar.
Se chama calma quando a amizade é tão sincera que todas as máscaras caem e tudo pode ser dito. ⠀

 

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Se chama calma e o entendimento do mundo vem da unicidade saindo do labirinto que inventa guerras que ninguém nunca vencerá. ⠀
Se chama calma quando o silêncio é apreciado, quando os ruídos não são apenas música e loucura, mas o vento, os pássaros, a boa companhia, o barulho do mar. ⠀
Se chama calma e não pode ser paga, não há moeda de qualquer cor que possa cobrir seu valor quando se torna realidade.

 

 

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Se chama calma e isso me custou muitas tempestades e eu as passaria mil vezes até encontrá-la novamente. ⠀
Se chama calma, a amo, a respeito e não quero deixá-la ir. 

 

 

Ode de Dalai Lama

Que caminho é este

29
Set19

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Que caminho é este, que parece levar ao mar, mas não, para além dele há serras e montes, só depois os rios e o mar. É um caminho estreito, com uma estrada já gasta, pouco estimada, ladeada de seres silenciosos e verdes, que abanam com o vento, acolhem a chuva e os pássaros, tem compromissos com os insectos, dão sombra fresca e purificam o ar que respiramos.

 

Que caminho é este que percorremos em estado neurótico, dando prioridade à especulação, ao egoísmo e à ganância. Que estrada tão sinuosa e cheia de armadilhas, onde a miséria se mantém à espreita sentada em baloiços de oiro, empurrados pela ignorância e com lacinhos de sadismo. 

 

Que caminho é este que afunila a cada dia, entrando cada vez mais gente em carreiro, dão tudo o que não têm, dão tudo o que não podem, têm os dias contados, mas pensam que têm a eternidade, e vão, sem virem, num único sentido, nada têm consigo, vazios, vagos, vendidos. Vendem-se sem valor, casos ocos, mudos, sem atitude.  

 

Hoje apetece-me contar uma estória

28
Set19

Era eu uma miúda e atravessava o Sado numa traineira, ao final do dia o cheiro do gasóleo entranhava-se nas minhas narinas, era também um cheiro de oceano, serra e rio, isto tudo misturado como resumo do dia, para mim estes cheiros funcionam como marcadores de memória.

 

Atravessava então o rio azul e manso, onde podia ver as várias correntes que entravam e saíam do oceano, na cabine e ao leme alguém levava o barco que trepidava a meus pés, era uma sensação relaxante, parecia coisa de brincar,  nas tábuas do barco escamas secas resistiam às lavagens, havia um cheiro a peixe que me lembrava gaivotas, beliches estreitos e claustrofóbicos, redes e aparelhos de pesca, fateixas, anzóis, e armadilhas para polvos, bóias vermelhas, um fogareiro, fogão, antena de rádio, uma bandeira, um santo. 

 

As cores do barco eram vibrantes, nas laterais por fora, estavam pendurados pneus, amarrados com cordas grossas, à proa estava escrito o nome da embarcação, na popa levava a reboque um bote, que servia para descermos para terra. 

 

Tudo ali me fascinava, havia tanto por descobrir, tanto por aprender. Como consertar uma rede, como lançar a rede, como armar os aparelhos(armadilhas de pesca), como recolher a rede, quais os melhores sítios para apanhar peixe, como chegar lá, como vencer as tempestades apenas com aquelas tábuas, como enfrentar a noite, qual a emoção ao receber o sol da manhã, o vento, a chuva, o sal, tudo tão vibrante ali naquele canto suspenso na água. 

 

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