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Alice Alfazema

Recortes do quotidiano: do meu, do teu, do seu, e dos outros.

Alice Alfazema

Recortes do quotidiano: do meu, do teu, do seu, e dos outros.

Regeneração

03
Ago18

 

 

 

Ando a fazer umas limpezas cá em casa. Estou a forrar os armários da cozinha, gosto de abrir os armários e as gavetas e ver algo colorido lá dentro, mania minha. Este ano são morangos, vermelhos e grandes. Também acho prático e ajuda a manter e a proteger os materiais durante mais tempo. Estão a ficar catitas. 

 

 

 

 

 

Este ano quero me livrar de tudo aquilo que me é inútil. Coloquei uns copos que tenho há muitas luas a uso, são bonitos e trabalhados, daqueles em que se serve uísque, a minha filha protestou dizendo que são giros e assim estragavam-se, respondi prontamente, que isto da idade nos dá outra sabedoria: Não ponho a uso? E depois o que acontece? Todos os anos tenho de lava-los e guarda-los, nisto já vai mais de vinte anos, entretanto eu vou desta para melhor e tu vais doa-los para serem sorteados numa quermesse qualquer, assim uso eu! Houve uma concordância silenciosa e o pai disse: a tua mãe quer libertar espaço. Isto nos homens é sempre uma questão técnica.  Com estes copos hei-de dar uma  jantarada para que fique claro que servem para alguma coisa e também para adquirirem uma boa energia sempre que se vejam em cima da toalha. 

 

 

 

 

Isto das limpezas é muito doloroso mentalmente, mas ao mesmo tempo é libertador. Ao nos livrarmos daquilo que não desejamos cria-se espaço mental e físico para um outro tipo de energia, no fundo regenera-nos. 

 

 

 

 

Esta é uma limpeza preguiçosa, está muito calor. Vou fazendo e relaxando em cima do sofá, mais um copito de água. Volto à tardinha, que já está mais fresquinho, desconfio de que quando acabar, estarei pronta para uma nova ronda. 

 

 

 

 

 

Ilustrações de Jennifer Balkan

 

 

Por estes dias já é Agosto outra vez

01
Ago18

Escrevi este texto neste blogue em Agosto de 2012. Passaram-se tantos dias desde então, no entanto continuo a gostar destas velhas palavras. Encontrei-as hoje ao acaso. Talvez hoje não as escrevesse assim. Lembro-me perfeitamente de quando as escrevi: estava sozinha, numa sala de aula vazia, e sentia o peso do silêncio e o vazio do espaço. Quando trabalhamos com muita gente é difícil preencher esse vazio, tanto nos sons como no espaço. Ficam as vozes durante muito tempo a habitar a nossa cabeça. 

 

Ilustração Norman Rockwell

 

 

 

Por estes dias a escola parece, assim à primeira vista, abandonada, no entanto, as pessoas continuam a entrar e a sair, não numa azafama, mas num passo mais descontraído.

 

Os pássaros, as formigas e as osgas tomam conta dos pátios, as aranhas apoderam-se dos tectos. É certo que os pássaros são em menor número, e que a alimentação que procuram é escassa. Por estas alturas não há restos de lanches deixados nos pátios, migalhas ou outros afins. Há um silêncio ensurdecedor, um calor sufocante, e imensas cadeiras vazias.  No entanto, parece que as conversas, os gritos e os risos ficaram no ar, parece que pairam esperando que alguém as transforme em som e alegria.

 

O vazio alastra, na tarde de Verão, os sons e as brincadeiras estão guardados no armário da memória, não tarda e aí estarão eles de volta ao pátio, às salas, às escadas, na fila do refeitório, na entrada. As bolas voarão tais como mísseis redondos e precisos (às vezes nem tanto), e vai chegar o tempo dos ralhetes, do refilanço, das angustias, dos amores e desamores.

 

E eles irão passar de meninos a adolescentes num ápice. 

 

De volta ao tempo, a mudez do som continua, alastrando consigo as memórias, os pássaros continuam procurando aqui e ali, as osgas escondem-se, e eu aqui, parece que fiquei presa nalguma saída do tempo.

 

 

 

Texto original aqui: A escola nas férias de Verão. Ou se preferirem...leiam nesta página.

 

 

 

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