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Alice Alfazema

Recortes do quotidiano: do meu, do teu, do seu, e dos outros.

Alice Alfazema

Recortes do quotidiano: do meu, do teu, do seu, e dos outros.

A criança

05
Ago11

 

 

A criança que eu fui não viu a paisagem tal como o adulto em que se tornou seria tentado a imaginá-la desde a sua altura de homem. A criança, durante o tempo que o foi, estava simplesmente na paisagem, fazia parte dela, não a interrogava, não dizia nem pensava, por estas ou outras palavras: «Que bela paisagem, que magnífico panorama, que deslumbrante ponto de vista!» Naturalmente, quando subia ao campanário da igreja ou trepava ao topo de um freixo de vinte metros de altura, os seus jovens olhos eram capazes de apreciar e registar os grandes espaços abertos diante de si, mas há que dizer que a sua atenção sempre preferiu distinguir e fixar-se em coisas e seres que se encontrassem perto, naquilo que pudesse tocar com as mãos, naquilo também que se oferecesse como algo que, sem disso ter consciência, urgia compreender e incorporar ao espírito (escusado será lembrar que a criança não sabia que levava dentro de si semelhante jóia), fosse uma cobra rastejando, uma formiga levantando ao ar uma pragana de trigo, um porco comer por um cocho, um sapo bamboleando sobre as pernas tortas, ou então uma pedra, uma teia de aranha, a leiva da terra levantada pelo ferro do arado, um ninho abandonado, a lágrima de resina escorrida no tronco do pessegueiro, a geada brilhando sobre as ervas rasteiras. Ou o rio.

 

 

 

 in, As pequenas memórias, José Saramago

 

 

Alice Alfazema

 

Conversas da escola (9)

05
Ago11

 

Numa escola pública, com mais de setecentos alunos…

 

- Olá!

- Olá!

- Por aqui nas férias, é para matares as saudades?

- Pois é…

- E as notas, foram boas? Como é a escola nova?

- As notas foram boas, a escola também é boa, tem mais condições que esta, não andamos há chuva…

-E o ambiente?

- É bom, mas aqui era melhor, lá somos mais um número… aqui éramos mais família…

- :)))

 

 

Alice Alfazema

Ambiguidade

04
Ago11

 

 

A convivência quotidiana, tanto o que é acessível a todo mundo, quanto aquilo de que todo mundo pode dizer; qualquer coisa vem igualmente ao encontro, então, já não mais se poderá distinguir; na compreensão autêntica, o que se abre do que não se abre. Essa ambiguidade não se estende apenas ao mundo ,mas, também, à convivência como tal e, até mesmo ao ser da pre-sença para consigo mesma.

 

 

in, Ser e Tempo, Martin Heidegger

 

 

Alice Alfazema

A fome de um mundo egoísta

04
Ago11

 

"Mais de 29.000 crianças morreram de fome na Somália nos últimos três meses, em sequência da pior crise humanitária no Corno de África"

 

 

 

Parece-me demasiado egoísta pensarmos que estamos em crise... quando há vidas assim; nós por cá (no mundo que se acha em crise) celebramos a celulite, a obesidade mórbida e,  oferecem-se prémios para a perda de quilos. Os meninos por cá só gostam da sopa passadinha, do peixe sem espinhas, da fruta em boiões, bebem leite enriquecido...talvez umas férias, nestas colónias lhes fizesse bem.

 

Os Srs. políticos preocupam-se com as suas estadias, com o conforto das suas viagens, com a cor das suas gravadas, penteados e conjuntinhos saia casaco, há os restaurantes gourmet,  o aumento do petróleo, a fotografia que saiu na revista da moda...por cá há tanta coisa que, assuntos como estes têm apenas um minuto ou dois de tempo de antena.

 

Ser solidário, exige sacrifícios de mordomias...

 

 

 

Alice Alfazema